STJ restabelece acusação de homicídio doloso em caso de morte em casa de recuperação em Caldas Novas

Caldas Novas / 351

De acordo com a denúncia, um dos acusados era dono do estabelecimento e, no dia do crime, a vítima chegou supostamente embriagada e sob efeitos de drogas ao local

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao dar provimento a recurso do Ministério Público de Goiás (MPGO), determinou que um caso de homicídio qualificado ocorrido em Caldas Novas, inicialmente desclassificado para a modalidade culposa pelo Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), seja submetido ao Tribunal do Júri. A decisão foi proferida pelo ministro Otávio de Almeida Toledo, desembargador convocado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), no agravo em recurso especial (AREsp 2919840).

Denunciados pelo promotor de Justiça Sávio Fraga e Greco, dois acusados sem qualquer qualificação médica teriam aplicado quatro injeções com substâncias como Diazepam, Haldol, Fenergan e Deca-durabolim em um homem já embriagado e sob efeito de entorpecentes em uma casa de recuperação em Caldas Novas.

De acordo com a denúncia, um dos acusados era dono do estabelecimento e, no dia do crime, a vítima chegou supostamente embriagada e sob efeitos de drogas ao local. A vítima, então, após uma discussão, se recusou a ingerir medicamentos que a deixariam dopada e supostamente ameaçou um dos acusados. Ainda conforme a denúncia, já com a vítima imobilizada, um dos réus disse, na ocasião, que cada injeção aplicada representava um “tiro” que ela havia, em tese, prometido de disparar contra ele. O laudo cadavérico e o parecer médico atestaram a morte da vítima por infarto agudo do miocárdio, causado pela administração indevida de medicamentos.

Os dois acusados foram pronunciados (determinação para julgamento pelo júri popular) em primeira instância, pela prática de homicídio qualificado descrito no artigo 121, parágrafo 2º, incisos III e IV, do Código Penal. Inconformada com a decisão, a defesa de um dos acusados recorreu ao TJGO para desclassificar a conduta para homicídio culposo.

Ao concordar com a defesa, o TJGO entendeu que a conduta configuraria homicídio culposo, afastando a possibilidade de dolo eventual e retirando a competência do Tribunal do Júri. A decisão se estendeu ao outro acusado.

Recurso do MP apontou elementos de dolo eventual

Para o MPGO, porém, os elementos descritos no próprio acórdão indicam que, ao menos em tese, houve dolo eventual. “Ao desclassificar a conduta do réu para a de homicídio culposo, o decisório recorrido não considerou que, ao ministrar alta dose de medicação na vítima, já alterada por uso de substância entorpecente, sem a devida qualificação técnica e sem a devida orientação médica, foi configurada a probabilidade legal do acusado ter, ao menos, assumido o risco de causar o resultado morte da vítima”, destacou o MPGO no recurso.

Em segundo grau, a atuação ficou a cargo da procuradora de Justiça Carla Fleury de Souza. Já o recurso especial e o agravo ao STJ foram assinados pela promotora de Justiça Yashmin Crispim Baiocchi de Paula e Toledo, integrante do Núcleo Especializado em Recursos Constitucionais (Nurec).

Ao analisar o caso, o ministro Otávio de Almeida Toledo concordou com o argumento ministerial e destacou que a Constituição Federal reserva ao júri popular a competência para julgar crimes dolosos contra a vida. Segundo ele, a desclassificação só é possível quando houver certeza inequívoca de que não houve dolo, o que não se aplica à situação, uma vez que existem indícios suficientes para que a questão seja decidida pelos jurados.

“A pronúncia encerra mero juízo de admissibilidade da acusação, bastando a existência de indícios razoáveis de autoria e materialidade. No caso, os elementos probatórios delineados no acórdão — aplicação de múltiplas injeções de medicamentos diversos em pessoa já intoxicada, sem orientação médica, com declarações indicativas de vingança — autorizam, no mínimo, a submissão da questão ao Tribunal Popular”, justificou o relator.

Com a decisão, o acórdão do TJGO foi cassado, e a decisão de pronúncia, que envia o caso para julgamento no Tribunal do Júri como homicídio qualificado, foi restabelecida. 

Fonte: Assessoria de Comunicação Social do MPGO
Foto: Reprodução/MPGO/STJ